quinta-feira, 19 de outubro de 2017

EDITORIAL: BAIXA, AFINAL, O QUE PRECISAS TU?

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)




Os jornais diários de ontem, Diário de Coimbra (DC) e Diário as Beiras (DB), em primeira página, faziam referência à reunião de terça-feira promovida pela APBC, Agência de Promoção da Baixa de Coimbra, entre comerciantes e em que estiveram presentes dezena e meia de interessados.
Na sua liberdade editorial cada um salientava o que considerava mais paradoxal. O DB chamava a atenção para “Som exterior no Natal só com comerciantes a pagar metade” - “A Agência de Promoção da Baixa pede ajuda para financiar animação natalícia”. Prosseguindo o desenvolvimento da notícia no DB, “Sem a comparticipação directa dos comerciantes não haverá sonorização das ruas da Baixa de Coimbra durante o Natal. O orçamento para a animação no período natalício vai forçosamente descer, em relação ao ano passado, em detrimento de outros projectos estruturais, como a criação de novas empresas culturais e criativas. O presidente da APBC, Vitor Marques, chamou os comerciantes para lhe prestar contas e orçamento para as actividades da sempre aguardada quadra natalícia. Enquanto, em 2016, foram gastos cerca de 19 mil euros, este ano há apenas disponível cerca de 7.000, assegurado pela APBC. (…) “Como tivemos de fazer opções, deixámos de fora a sonorização das ruas, que tem um custo de 4.300 euros, e que propomos repartir pelos comerciantes”. Sem essa comparticipação dos comerciantes, “não haverá sonorização, porque a APBC não se vai endividar”, garante Vitor Marques. A Agência recebeu um financiamento da Câmara Municipal de Coimbra de 35 mil euros para 2017, sendo que “cerca de 26 mil estão executados até à data, à média de uma actividade por mês”.

20 NOVAS EMPRESAS CULTURAIS E CRIATIVAS

Continuando a citar o DB, “O “projecto do ano” para 2018 chama-se “Indústrias culturais como alavanca do território” e tem “como objectivo final a criação de 20 novas empresas no centro histórico dentro deste sector”. Com uma comparticipação de 85 por cento, o projecto custa 300 mil euros, o que quer dizer que a APBC tem de encontrar “cerca de 45.000 euros para este projecto, que a direcção entende que é estrutural para a Baixa. (...)”

PARAR PARA RESPIRAR

Comecemos por elencar o “Artigo Terceiro” -Objecto” do Regulamento da APBC:

1- A Agência tem como objecto social a promoção e modernização da zona da baixa de Coimbra, visando a requalificação daquela zona e o desenvolvimento da gestão unitária e integrada de serviços de interesse comum;
2- Para a prossecução do seu objecto social a Agência propõe-se realizar, entre outras, as seguintes actividades:

a) Realizar e gerir um plano de marketing e comunicação;
b) Promover e publicitar o conjunto comercial;
c) Definição dos horários dos estabelecimentos;
d) Promover a uniformização da época de campanha comerciais;
e) Garantir a animação da baixa;
f) Fazer estudos de mercado e estudar os hábitos de compra;
g) Editar um boletim informativo;
h) Instalar postos de informação aos consumidores.

INTERVALO PARA PERGUNTAS

Depois de em cima consultarmos o objecto social da APBC, isto é, o seu propósito, a finalidade da sua sua acção, surgem questões:
Pergunta: Terá a APBC vocação para desenvolver o conceito de incubadora de empresas na Baixa?
Resposta: Salvo melhor opinião, não tem. Lendo o ponto 1 verifica-se que o seu âmbito é “a promoção e modernização da zona da baixa de Coimbra, visando a requalificação daquela zona e o desenvolvimento da gestão unitária e integrada de serviços de interesse comum”.
(Requalificar: “conjunto de atividades que visam melhorar uma zona pública a nível urbanístico, ambiental, paisagístico, etc.; revitalização”)
(Desenvolvimento da gestão unitária e integrada: “Desenvolvimento de uma administração visando o (mais baixo) custo unitário (ao conjunto de custos, fixos e variáveis) e integrada (combinação de partes ou etapas que funcionam de forma completa) de serviços de interesse comum.”
E se dúvidas houver sobre a interpretação da sua acção vejamos as alíneas a) b) c) d) e) f) g) h). Todas elas remetem para a prossecução e desenvolvimento da actividade comercial na Baixa, incluindo a animação.

Mas imaginemos que, com outra leitura mais avalizada, até podia mesmo explorar o conceito de incubação de empresas:
Pergunta: É legítimo a direcção de uma entidade que visa a promoção de um sector de actividade afirmar que ““Como tivemos de fazer opções, deixámos de fora a sonorização das ruas, que tem um custo de 4.300 euros, e que propomos repartir pelos comerciantes”. Sem essa comparticipação dos comerciantes, “não haverá sonorização, porque a APBC não se vai endividar”.
Constatação: A APBC não se vai endividar por 4.300 euros para animar as ruas.
Constatação: Vão ser gastos 300 mil euros na incubação de empresas. Esta verba total está assegurada em 85 por cento -255.000 euros- por financiamento europeu. Faltam 45.000 euros. Onde se vão buscar? Para os obter a APBC não precisa de se endividar?
Pergunta tola: Será que a verba que falta não virá directamente dos cofres do município? Em 24 de Julho de 2017 -Deliberação n.º 3076/2017 (Processo 27313)- foi aprovado um subsídio de 55.000 euros para a APBC. 
Pergunta tola: A APBC não está a ser utilizada para um serviço que caberá por inteiro à Câmara Municipal?
Pergunta tola: Com esta prestação servilista, canalizando forças e verbas indevidamente, não estará a prejudicar as suas dezenas de associados e toda a Baixa no seu conjunto?
Pergunta tola: É legítimo estar a financiar pequenas empresas “startups” quando a maioria de operadores comerciais está de corda ao pescoço, afogado em dívidas?

Haveria muito mais perguntas mas, para não ser demasiado longo, fico por aqui.
Valerá a pena pensar nisto?

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