sábado, 9 de julho de 2016

EDITORIAL: TANTA FESTA, PÁ...!





Coimbra comemora o V centenário da beatificação da Rainha Santa Isabel, padroeira da Lusa Atenas. Integrando as Festas da Cidade de Coimbra e da Rainha Santa Isabel, este ano, como não há memória, tem sido um encher o olho de actividades seculares e religiosas.
Se eu fosse optimista -que me parece ser o caso-, diria que, tendo em conta o anterior cenário de acções lúdicas na cidade, não há fome que não dê em fartura. Desde a vinda de vários artistas ao recém-inaugurado Centro de Congressos São Francisco, passando por uma Feira Popular que convence, até à congregação de várias festas normalmente não englobadas no programa, reconheço que estamos a viver um momento único no historial festivaleiro da cidade. Até o êxito da selecção nacional de futebol por terras de França está a ajudar a esquecer as normais preocupações da época. Se fosse pessimista, diria que a factura para pagar tudo isto virá depois. Sendo realista, com muito positivismo à mistura, direi que depois se verá. Retirando os “ses”, com franqueza, declaro: gostei de ver.
Até hoje, Sábado, foi bonito de verificar a Feira da Rainha Santa na Praça do Comércio. Durante a manhã deu um gozo danado ver as ruas estreitas serem percorridas com os grupos folclóricos e as suas melodias tradicionais encherem a nossa alma. Como já escrevi tanta vez, é pena que o comércio no seu todo não responda a esta chamada e ao bater das 13 badaladas quase todos os lojistas desertem em busca de uma sombra paradisíaca melhor. Já escrevi tanto sobre este abandono que até me fadiga. A pergunta -sem resposta- que faço a mim habitualmente é: se as coisas estão más, por que razão não se esforçam mais os profissionais do negócio? Mesmo a custo, tenho de reconhecer a razão a algumas críticas que se fazem a este fraco desempenho profissional. A crise será mesmo grande como a pintam? Enquanto comerciante, com as mãos na massa já há décadas, sinto que sim. De facto as coisas estão mesmo complicadas. Mas, sendo assim, como entender que com este movimento febril na cidade, com o turismo a começar a chegar -apesar de se dizer o contrário, estes primeiros seis meses foram piores do que no ano transacto-, tudo continue no remanso e pacatez habituais? Às vezes penso que só eu sinto dificuldades. Claro que não é verdade. Depois de uma duração de pouco mais de seis meses em actividade, volta e meia lá se vê uma loja a fechar e, algumas vezes, a transferir instalações para outra zona da cidade em busca de uma clientela melhor -esta semana foi um estabelecimento na Praça do Comércio que embarcou.
Quando tento entender, em forma de catarse, olho para trás e vejo o quanto os meus pais, na década de 1950, laboravam na agricultura para que, pelo menos, a fome não invadisse o espaço familiar. Numa estupidez minha, na altura, não conseguia perceber como é que, denegando o ócio, trabalhavam de sol a sol e todos os dias da semana. Tinha dificuldade em aceitar que, escolhendo o esforço físico, o meu pai não frequentasse a taberna da aldeia e ao Domingo fosse jogar ao fito ou uma “suecada” com os restantes homens da aldeia. Tive de transpor as portas da velhice para alcançar o grande significado de abnegação dos meus progenitores. Por que eram assim? Seria apenas ambição para ter uma vida melhor? Ou, pelo contrário, seria a recusa em render-se a uma miséria que teimava em rodear a maioria dos vizinhos? Provavelmente as duas premissas estarão certas.
É por isto mesmo que sinto impedimento em abarcar totalmente a essência das coisas. Mas também não faz mal! Parcialmente consigo lograr que, efectivamente, a vida nem está tão difícil assim -pelo menos comparando com quando eu era criança, na época dos meus pais. Tenho para mim que, nos nossos dias, a maioria -não todos, felizmente- perdeu uma certa vergonha e necessária ambição, que implica suar a estopinhas para almejar um caminhar de cabeça erguida, sem alguém a perseguir-nos por que lhe devemos dinheiro. A meu ver, hoje temos uma população vencida, cativa ao situacionismo. Com pouco passa e com pouco se mantém. Se reclama é em surdina. Nunca dá a cara -e se a der diz o contrário do que pensa e de acordo com o interlocutor.
Está tudo numa “nice”.

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