sábado, 1 de novembro de 2014

DIRECÇÃO DO RANCHO DE COIMBRA DEMISSIONÁRIA



A Assembleia Geral, marcada para as 20h00 de ontem, quinta-feira, nos editais distribuídos pela Baixa e publicado n’O Despertar, começou uma hora depois, às 21h00, no Rancho das Tricanas de Coimbra. A reunião prometia fazer correr insultos e mais que desse. Ao que parece, em Agosto, um ensaio de folclore acabou em ensaio de pancadaria entre mulheres e sentia-se a tensão entre o grupo de cerca de uma vintena de associados presentes. Como em tudo o que são movimentos associativos de pessoas, há sempre duas correntes, uma que vai na onda e outra que vai contra.
A liderar a assembleia, como presidente eleito, no meio da mesa, estava Carlos Clemente -que, embora o Rancho se mantivesse inactivo durante os últimos anos, até ao anterior sufrágio, e durante vários mandatos, comandou uma das mais antigas colectividades da Baixa de Coimbra. Ao seu lado direito, acompanhado por alguns membros do actual executivo, estava Luís Montenegro, o presidente da direcção.
Mal começou o congresso, imediatamente, estalaram as hostilidades contra Montenegro. Lançado por uma associada, caiu logo um petardo de “mentiroso”. A coisa prometia serrabulho. A assistência, com uma vontade danada de despejar o que levava na alma e atropelando-se nas intervenções, como se estivesse no Coliseu Romano, revolvia-se inquieta e pedia sangue. Como um sino a bater Trindades, uma voz proclamava: “Eu quero saber da minha carta de demissão!”
Clemente, adivinhando violência verbal, puxou dos seus galões de apaziguador e ao mesmo tempo ia contando aquela história velha e nossa conhecida: “no meu tempo era assim!”. O problema era que ali havia demasiada areia para a sua camioneta e acabou a enfiar os pés pelas mãos. Ora misturava o seu papel de presidente da assembleia, onde há necessidade de ser árbitro imparcial, ora amassava reivindicações de associado comum e fazia de relator com perguntas. Para seguidamente, centralizando tudo, dar as respostas carregadas de paternalismo para com Montenegro e admoestando a assembleia: “não podemos sacrificar o senhor presidente da direcção. Provavelmente ele delegou nas pessoas erradas!”. Ocupando todo o espaço áudio, impunha silêncio e reinava na pequena sala onde a ignorância geral se apanhava às pazadas. Não dava a palavra a alguns sócios que, alegadamente, não teriam as quotas em dia –estes defendiam que não puderam pagar por não saberem o seu número de associado e mais coisas e tais. Montenegro, ao lado de Clemente, enfiado na cadeira, como passarinho encolhido, como se apelasse a um qualquer santo “tira-me daqui”, via, ouvia, abanava a cabeça e nada dizia. Lá no canto da sala um já desaparecido ensaiador que faz tijolo há muitas décadas, em foto a preto e branco, parecia ensimesmado com tudo o que se estava a passar à frente dos seus olhos e não parecia querer sair da terra onde jaz e voltar para o meio daquele forrobodó. Até a Tricana de Coimbra, bem retratada na tela, provavelmente por António Vitorino na década de 1930, estava incomodada com a situação e sugeria querer dizer: “levem-me daqui!”
No calor da noite e da discussão cruzada, dois associados ameaçaram abandonar a sessão mas, depois de divinos apelos à serenidade, lá voltaram a sentar-se. E mais uma vez se ouviu: “eu quero saber da minha carta de demissão!”
No fim do encontro Luís Montenegro assumiu que, pelos interesses da colectividade, estava a tentar que a direcção não caísse mas, perante o que se passou nesta Assembleia Geral, não estava para aguentar tanto desaforo, -que lhe tirava anos de vida, descanso e dinheiro- e iria apresentar a sua demissão.
Vamos aguardar as cenas dos próximos capítulos.





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