segunda-feira, 28 de junho de 2010

BAIXA: A MALDIÇÃO DA AVENIDA CENTRAL

(Esta imagem, da segunda alma do meu amigo João Monteiro, foi retirada da web)



 Espiolhando a Internet, tudo teria começado na década de 1930. Duarte Pacheco, ministro das Obras Públicas e Comunicações de Salazar, para renovar a política urbanística, e que dariam origem aos primeiros Planos de Urbanização do país, convida vários arquitectos de renome internacional, entre eles o francês Etienne de Gröer, que trazem para Portugal o conceito de “cidade-jardim”, em voga por toda a Europa. É então que na década seguinte de Gröer apresenta na Câmara Municipal de Coimbra o plano “Urbanização Embelezamento e extensão da cidade”. Num dos projectos, o urbanista francês defende a ligação, em forma de avenida, entre a Praça 8 de Maio, ligando à Avenida Fernão de Magalhães, e o Rio Mondego. Em meados da década de 1960, depois de expropriadas várias habitações, dá-se início à desconstrução para abertura do canal. Certamente por dificuldades nas finanças públicas, talvez pelo rebentar da guerra colonial, as obras param poucos anos depois no início das Ruas da Moeda e Louça e nasce um buraco que se virá a chamar “Bota-Abaixo”.
Em 1999, através de concurso, a autarquia, de executivo PS, vendeu o terreno à firma Braga-parques por cerca de um milhão de contos. Esta empresa de Braga veio nos dois anos seguintes a construir naquele espaço um grande estacionamento, comércio e habitação. Esta venda seria investigada em 2007 pela Polícia Judiciária e viria a constituir dois arguidos, um vereador socialista e o dono da empresa bracarense.
 Em 1996, através de Escritura Pública, é constituída a Sociedade Metro Mondego, que actualmente tem a seguinte representatividade: Estado Português 53%; Município de Coimbra 14%; Município da Lousã 14%; Município de Miranda do Corvo 14%; REFER 2,5% e CP 2,5%.
Como se sabe este projecto, que está na génese da criação da empresa de capitais exclusivamente públicos, é um sistema de transporte público de massas do distrito de Coimbra, que circularia em rede de caminhos-de-ferro electrificada, na zona urbana da cidade e suburbana até à Lousã, passando por Miranda do Corvo.
Embora já na última metade de 1990 o presidente desta empresa começasse a ganhar cerca de 800 contos, só o custo de planeamento e construção de projectos será qualquer coisa impossível de contabilizar.
É no mandato de Carlos Encarnação, actual presidente da assembleia-geral, já depois de 2002 que o projecto ganha velocidade. Sob o espectro da expropriação, começam as negociações com vários residentes e alguns comerciantes entre o “Bota-Abaixo” e a Praça 8 de Maio.
 Em 2006, com grande encenação começa a demolição. Este acto, juntamente com promessas de realização, ajuda a reeleger o actual presidente da Câmara de Coimbra. A presidente da Câmara de Miranda do Corvo e o da Lousã, com as mesmas promessas, são reeleitos.
Depois de 103 anos de actividade, a linha da Lousã foi interrompida no dia 4 de Janeiro. Entretanto começaram a ser desmantelados os carris e os residentes daqueles concelhos começaram a serem transportados em autocarros.
Veio há uma semana o Governo, justificando-se com o PEC, colocar em causa as obras do Metro. Esta obra –na minha opinião modesta, faraónica e megalómana- não deveria ter sido reavaliada muito antes de ser iniciada? E agora? Os milhares de residentes de Miranda e Lousã, passando pelas pequenas localidades, por irresponsabilidade, vão continuar a andar de autocarro por curvas e curvinhas que lhes consome mais tempo de viagem? Mesmo que se suspenda todo o restante projecto para Coimbra é obrigação do Governo fazer a reposição da linha da Lousã.
Há dias a ACIC, no Diário de Coimbra (DC) vinha defender que o corredor central na Baixa deve fazer-se mesmo sem Metro para “dar nova vida ao comércio e aos estabelecimentos”. Em nome do valor justiça, as demolições devem parar imediatamente. Se o objecto do projecto que deu origem à desconstrução desapareceu, é um abuso de direito continuar com a obra. Não parar com este absurdo é contribuir para o enriquecimento de especuladores que já há vários anos estão à espera da avenida central. Já agora, interrogo: que mais-valias traz um nova avenida para a Baixa?
Em nome da justiça, deve a Metro Mondego restaurar todas as habitações que não foram entretanto demolidas e, a preços controlados, arrendar e dar a possibilidade dos antigos residentes voltarem a ocupar os sítios onde nasceram e, sob ameaça de expropriação, foram “enxotados” para a periferia.
Em nome da justiça, deve a Metro Mondego arrendar, a preços controlados, aos anteriores comerciantes os espaços comerciais que não foram demolidos, como, por exemplo, a loja de brinquedos Joaninha, na Praça 8 de Maio, em que sob o anátema da expropriação a empresa Metro contribuiu para a falência do comerciante João Monteiro.
Em nome da revitalização da Baixa, aproveitando para reordenar o Largo das Olarias, retirando os ciganos e dando-lhes condições de venda mais dignas, no buraco aberto no “Bota-Abaixo”, deve construir-se um centro cultural de dois ou mais andares, até à cota de construção existente. Neste centro de animação permanente seriam apresentadas feiras temáticas –como, por exemplo, a feira do livro, cujo aluguer da tenda custa aos cofres camarários cerca de 20 mil euros, anualmente.
Em nome do valor honra, e no caso do total fracasso deste projecto, deveriam os três executivos camarários, Coimbra, Miranda e Lousã, membros da sociedade Metro Mondego, apresentarem desculpas públicas e a sua demissão.

Sem comentários: