quinta-feira, 5 de março de 2015

EDITORIAL: A "CHINATOWN" EM MARCHA





A Daline, um estabelecimento com 21 anos de existência e uma área invulgar na comparação com outros estabelecimentos comerciais, funcionou no Largo do Poço. Conforme dei notícia, encerrou no último dia do mês de Fevereiro e, com este claudicar, enviou cinco funcionários para o desemprego. Segundo informações que recolhi de fonte fidedigna, pagava uma renda cerca de 1500 euros. Passaram cinco dias do correr do pano e, alegadamente por quem sabe, já há várias ofertas ao proprietário, sendo a maior até ao momento de 2.750,00 euros provinda de um comerciante chinês.
Interrompo a explanação para uma ressalva: nada me move contra povos migratórios que aqui, no país, tentam ganhar a vida –desde que as condições de acesso sejam iguais aos portugueses, autóctones. A questão é saber se as armas utilizadas, como quem diz as regras, no desafio são as mesmas para quem chega de fora e para quem cá tenta sobreviver. É que se são diferenciadas, positivamente pelo benefício, estamos a permitir sermos enxovalhados e maltratados de uma forma ultrajante. Alguém tem obrigação de clarificar e mostrar a razão desta assimetria.
Depois da emenda, parto para perguntas. Damos uma volta pelos estabelecimentos orientais e verificamos que, quer sejam grandes ou pequenos na dimensão, estão vazios de clientes. Pelo que se vê e adivinha, pelo movimento de caixa, é impossível em condições normais, de paridade, pagarem estes valores astronómicos. A primeira interrogação: como podem estes negociantes do Sol-Nascente inflacionarem as rendas desta maneira? Que condições lhes são concedidas pelo Estado Português –no âmbito da ratificação do acordo da Organização Mundial de Comércio- para poderem pagar o que um normal investidor nacional não pode?
Bem se sabe que as autarquias locais, em princípio, não podem impedir a instalação de um qualquer negócio desde que cumpram as normas. Uma outra interrogação: sabendo todos que a Baixa está prenhe de lojas chinesas não se faz nada para repensar e criar meios em que a diversidade seja possível? O que se quer fazer desta área velha?
Em jeito de contrição, poderemos dizer que, praticamente, toda a roupa vendida na Baixa, em lojas de administração portuguesa, é de origem chinesa. Poderemos invocar que, por exemplo, a REN é de capitais chineses. Ou seja, o dinheiro manda e pode. O problema, parece-me, será que não deveríamos resguardar qualquer coisa deste país retalhado e vendido em fatias? Bem sei que a palavra “Pátria” morreu e jaz enterrada, e quem a evoca, como eu, é logo catalogado nos opostos: ou é de extrema-direita ou radical de esquerda. Sabendo que estão previstos alguns encerramentos de lojas antigas até ao fim deste ano, onde fica o bom senso? Valerá a pena invocar a cultura nacional? Ainda existe? E a produção? E a mão-de-obra? Pela indiferença crescente, interessa falar nisto numa cidade recentemente classificada pela UNESCO como Património Universal da Humanidade?
O que é que se passa com um rectângulo que em 1143 se tornou independente e foi baptizado de reino de Portugal? Por ironia do destino, o seu fundador –mais que certo envergonhado e arrependido, Dom Afonso Henriques, descansa, no sono eterno a dois passos de tudo isto, na Igreja de Santa Cruz. Pela sua memória não era melhor discutir este assunto?


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