sábado, 28 de junho de 2014

UMA HISTÓRIA QUE CHEGA AO FIM

(Imagem da Web)


Talvez por algum pudor, é a primeira vez que escrevo sobre isto: dentro de alguns dias vou assinar o meu divórcio. E estou bem? Pareço vê-lo a si, leitor, interrogar. Tenho dias! Uns melhores, outros piores. Tenho um por outro que me sinto carregado de solidão! Mas na maioria deles, passo bem. Isto é, encaro este desenlace como um caminho que se acaba, uma história longa, de 37 anos, que chega ao fim. Tudo é finito e, como tal, o amor também. É um drama? É o cair do mundo? Não creio. Temos sempre de dividir o fim de um casamento em duas partes: a material e a emocional. E que, na sua consequência para o casal, tem redundado em demasiadas tragédias familiares.
Quanto ao lado material sem guerras mesquinhas, de cada um querer deixar o outro prejudicado, estamos, ambos, a proceder de boa-fé e sem esquecer que temos filhos e um longo passado comum. Vou-me aborrecer se vou ficar sem uma pintura que gostava muito? Isso é que era bom! Tenho 57 anos e, provavelmente e na melhor das hipóteses, viverei mais 20 ou 25 anos. Então, por tão pouco, vale a pena estar a lavrar uma guerra por porcarias que não valem um costelo? Quando morrer não vou levar nada! E mais, orgulhosamente sou filho de gente muito humilde. Nasci e cresci num berço quase de palha. Por isso mesmo, por tudo o que conseguimos juntos, estou muito grato à minha, ainda, mulher. Nunca me esquecerei disso. Claro que as coisas não são tão simples assim, confesso. Alguns valores que vou deixar custaram muito a conseguir e transportam a minha marca gravada a ferro incandescente. Todos eles levam uma lágrima de sofrimento pelo custoso adquirir e um sorriso que lhes dei na última prestação. Mas, paciência! Tudo na vida tem um custo. Para conseguirmos uma grande vitória, inevitavelmente, somos derrotados num qualquer campo menor.
Quanto ao lado emocional, pelo menos no que me toca, tento levar a vida para a frente, sem pensar muito no que está acontecer. O que mais custa nem será a separação de facto e de direito mas sim a sensação de falhanço que me envolve. Quando casei, em 1977, estava convencido que era para toda a vida. Assim não aconteceu. Paciência! Há culpados? E tem mesmo de haver? Não sei se tem, mas a haver culpa, naturalmente será dos dois. Não vamos entrar em conflitos de atribuições de responsabilidade. Nada disso! Estamos em paz! Pelo menos parece|
Como disse em cima tenho dias em que me sinto muito só. Hoje, por acaso, é um desses dias. E porquê? Porquê? –pressinto novamente os seus olhos incisivos sobre o texto. Vamos com calma, que eu estou a escrever para desabafar –já agora, sabe o que significa desabafar? Pois, se não sabia, quer dizer “desforço”, desfazer o esforço, descarregar a alma, exteriorizar os sentimentos reprimidos que conduzem ao alívio. Olhe, estou chateado porque me aborreci com a minha namorada há uns dias e, se calhar, acabou de vez –quem consegue perceber as mulheres? Se assim fosse fácil de as compreender, mais que certo, eu continuaria casado, e, com isto, não quero dizer que a culpa é dela, que eu sou um anjo e ela um demónio. Nada disso, tenho consciência que sou um tipo difícil de aguentar. Esta minha nova namorada, já de vários meses e depois da minha separação de facto, tem sido para mim o suporte, a superestrutura que me faz resistir a uma série de contratempos, para não dizer fracassos. Por isto mesmo, hoje sinto-me irritado, vazio, e com pouco ânimo. Sinto a falta dela. A sua companhia tem sido a rede que faz a triagem entre o que de menos bom me tem acontecido nos últimos tempos. E acabou? Pareço vê-lo novamente com o nariz esticado e as orelhas no ar. Sei lá se acabou? Mas, se assim foi, logo se vê! O que se há-de fazer? Matar-me? Ora, ora! Há-de vir outra mulher para a substituir. O mundo não se acaba para quem se separa. “Guardado está o bocado para quem virá apanhá-lo”, diz o povo na sua eterna sabedoria. Já deu para ver que, tirando a tristeza que me invade hoje, felizmente estou muito bem. Em paz com a minha auto-estima, sem precisar de recorrer a qualquer tipo de droga, incluindo álcool, ou mesmo a um qualquer psicanalista ou psiquiatra.
E por que falo sobre tudo isto que, no fundo e se calhar, até pode parecer ridículo? Porque, por um lado, nos últimos anos, devido a separações e divórcios, tem havido demasiadas mortes devido a violência doméstica e quase sempre pelo fim da relação –no ano passado foram 38 e este ano já vai em 18. Não é que pretenda ser exemplo para quem quer que seja mas, em boa verdade, cada um de nós é sempre um espelho social e que leva outros, em imitação, a seguir o que fazemos. Então, já que tenho facilidade em escrever, e uma vez que estou a passar por uma situação que tantos casais já passaram e muitos deles estão a passar com grande sofrimento, vou tentar nos próximos tempos relatar o que se passa comigo. Quem sabe, com a minha narrativa, possa ajudar alguém? Faço isto, ressalvo e repito, por dois motivos: para me servir de catarse e ao mesmo tempo para que quem estiver com o mesmo problema perceba que há mais vida para além de uma estrada planeada e, acima de tudo, que não se pode deixar abater nem descarregar no outro, ou outra, a frustração. Temos de aprender a lidar com os desenganos e desilusões. É assim! Vamos em frente! Quanto a mim, fico bem. Tudo se vai recompor. Claro que se a minha namorada me telefonar a pedir desculpa do que fez há uns dias ficarei muito melhor. Se não ligar, paciência!


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