segunda-feira, 1 de abril de 2013

CULTO OU CULTIVADO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)



POR JOSÉ XAVIER NUNES

 Por vezes nem eu sei as coisas que sei, tal é a abundância de cultura em que estou mergulhado e de que estou imbuído. Até me espanta saber que caso não fosse o nosso venerando Presidente da República com as suas virtudes ainda estaria hoje muito pior do que é suposto estar. Neste caso fui cultivado... assim a modos de um campo de batatas. Ser culto é ouvir, por exemplo, o Prof. Marcelo e ficar com a cabeça cheia de dúvidas e de seguida escutar o Miguel Sousa Tavares e pegar uma carrada de sono. Mas isto é o que alcança a minha cultura... e a demais de uns quantos milhões de cidadãos viventes neste país separado de Marrocos por um simples estreito, ao que consta, com muitos macacos cheios de privilégios. Tantos como o direito de defecar, urinar e acasalar, nas Portas de Hércules. Já aprendi tanta coisa na cultura deste país, desde os afluentes de todos os rios até aos ramais ferroviários de aldeias que nem constam no mapa, que acabei por não perceber a poesia do Pessoa. O que é a prova de que não devo estar muito atento ao caldo cultural que vou tragando servido em cálices de petulância e pedantismo. Adiante. O meu propósito é provar que não sou estúpido, mas culto... e cultivado. Sei muito bem que a distância da Terra ao Sol é proporcional na razão directa da distância do Sol à Terra. Que há estrelas que já morreram e muitos buracos negros... Sei que a batata é um tubérculo, sem direito a assento parlamentar! Até sei que o meu país é uma democracia, onde se pode roubar, intrujar e mentir, com plena liberdade... Sei que há ricos e pobres, mais uns que outros, mas, caramba, na Natureza nada é equilibrado... segundo a lei da evolução que transforma macacos em homens, como a democracia capitalista transforma ricos em pessoas distintas. As coisas que eu sei, que eu aprendi, os sapos que engulo, são resultado de uma cultura de culto. Parece uma afirmação idiota, mas não passa disso mesmo: uma afirmação de um cultivado... Não tenho é lá muito bem a certeza se sei cantar o hino nacional, pelo menos num tom afinado, mas consigo decifrar uma receita culinária e ler o Manual de Catecismo, por defeito de cultura adquirida... Sei que num ano há quatro estações, mas não sei quantos apeadeiros... porque todos os meses, senão mesmo todos os dias, ando a correr atrás de comboios. Por deficiência não obtive nenhum canudo, logo sou autodidacta. Um título que se consegue a pulso... caso queiramos contar para a História. Se formos modestos, humildes e nos estejamos a borrifar para histórias, podemos ser simplesmente... cultivados. O que agrada a muita gente...

1 comentário:

noname disse...

O meu amigo Zé, tão assertivo como sempre