segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O LEITOR DA EDP



 Eu estou muito velho. Não pareço, porque me continuo a sentir um puto traquina, mas estou mesmo! Eu sei disso! Ultimamente acontecem-me tantas! Às vezes estou a escrever, por exemplo, sobre o Iraque e, de repente, numa esquizofrenia aguda, passo a retratar a revolução do Irão. Apercebo-me desta minha longevidade sobretudo quando encontro alguém que não vejo há muito tempo. Olho para o meu conhecido, meço as estrias da sua fronte e só me apetece gritar: ai, Jesus, se este está assim todo engelhado e a precisar de ferro de engomar, como é que eu devo estar?! Outras vezes é quando me olho ao espelho e não reconheço a imagem que vejo à frente. Até me apetece cumprimentar o meu pai. Só depois vejo que aquela figura projectada é mesmo a minha. Coitado de mim, que era tão bom rapaz quando era novo! Valha-me Deus!
Vejam bem que ainda sou do tempo em que o funcionário que vinha ler o contador da EDP se apresentava minimamente trajado; não digo que fosse de fato e gravata, mas que, no primeiro olhar, uma pessoa não duvidava de que de facto ele era mesmo o controlador dos “quilowatts”. Há uns tempos para cá, batem-nos à porta uns rapazes de calções abaixo do joelho, de sapatilhas, e com um colete a indicar “leitor ao serviço da EDP”. Uma pessoa fica baralhada. Não sabe se está perante um membro de apoio de uma qualquer banda musical que passa pela cidade ou se será alguém a pedir uma moedinha para uma qualquer obra da senhora dos aflitos. Estou muito velho, não estou? Pois estou!

6 comentários:

vitor gaspar disse...

o senhor tem toda a razão pela cronica que escreveu mas ja pensou que a pessoa em causa foi fotografada e exibida num meio publico sem seu conhecimento? sera que no seu tempo tambem se punha o trabalho das pessoas em risco tão levianamente? da que pensar não da?

LUIS FERNANDES disse...

Muito obrigado por ter comentado, senhor Vitor Gaspar. Por acaso o senhor consegue reconhecer o homem da foto? Mais ainda, chamar a atenção para este facto, que no mínimo é timorato, é um acto leviano? Já agora pergunto-lhe: o que é para si um acto responsável e fundamentado?

Anónimo disse...

Com todo o respeito Sr Luis Fernandes, experimente fazer mais de 8 km diários a pé, ao sol, à chuva. De certeza que terá outro pensamento...Eu como leitor não ando de calções, mas quantas vezes olhei para eles e tive tentado a vesti-los.

Cumprimentos,


João

Anónimo disse...

De certeza que lhe caiu algum "parente na lama" com os calções do leitor.
Estou certo que tb ainda será do tempo em que a EDP tratava os seus leitores de um forma condigna quer na remuneração quer no tratamento pessoal.
Da próxima calce-lhe as sapatilhas pense nos kms que faz, na ultima vez em que ele foi mordido por um cão ou que teve de entrar numa daquelas casas que só com algodões embebidos em perfume enfiados pelo nariz dentro lá se consegue entrar isto só para citar alguns exemplos.
O seu ideial poderá estar ainda preso as calças de fazenda vincadas.
Para um sonhador deve-se ter esquecido que o mundo gira.
Os calções so me incomodam se a pessoa que os vestir for mal educada.
Espero ter sido merecedor da sua atenção e tb espero que aquela pessoa não tenha sido penalizada por o Senhor ter sido tão "puto traquina".
A.
Jardim

LUIS FERNANDES disse...

Meu caro A. Jardim. É evidente que o seu comentário vale tanto como o texto que escrevi. Ou seja, os dois valem zero. Não passam de opiniões subjectivas. Porém há um pormenor, que a meu ver não é de somenos, quem presta um serviço, entrando dentro de nossa casa, deve mostrar-se minimamente com alguma apresentação -e aqui pode interrogar: mas o que é isso de se apresentar minimamente? Qual é o parâmetro? Qual é o conceito? Pois! De facto não há um modelo assente -porque se calhar também não é necessário. Sabe-se que este mínimo de que falo radica num certo bom-senso, um equilíbrio entre o costume mais antigo e a modernidade. Isto é, não se pode cair completamente na modernidade (como é o caso) e esquecer o tradicional como estávamos habituados a ver. Não sou defensor de fardas. E vou dizer-lhe porque, na altura, escrevi esta crónica. É que uns dias antes vi entrar no meu estabelecimento um destes leitores da EDP, de cabelos compridos, barba por aparar, e de calções. Palavra de honra que duvidei que aquele indivíduo, na forma vestida, fosse mesmo quem apregoava ser. É evidente que poderemos sempre especular até onde nos leva a boa apresentação de quem se nos apresenta para nos vender alguma coisa. Mas uma coisa continuo a teimar meu caro(a) esta vestimenta é demasiado vanguardista. Tem de haver limites para tudo. A liberdade tem fronteiras. Imagine, por exemplo, nos comboios da CP, cujo revisor usa uma farda da empresa, andar vestido desta maneira. Gostava de ver? Será que estava correcto? De qualquer modo, fique a saber que respeito o seu ponto de vista. Mesmo não sendo coincidentes, tem razão de ser. Obrigado.

P.S. -Obrigado por me apelidar de "puto-traquina". Gostei!

Anónimo disse...

Caro senhor, estou certo que ao revisor da CP muitas vezes lhe daria antes jeito uma pistola a uns calções visto as intemperies dentro dos comboios serem de outra "natureza".
Posto isto devo-lhe referir que de há dois anos para cá as fardas dos correios têm calções e imagine-se até alguns policias andam de calções.
É pena não escrever nem o incomodar sobre a invasão de privacidade a que aquele sujeito esta exposto por si.
A. Jardim