sexta-feira, 19 de outubro de 2012

EDITORIAL: O CIRCUITO FECHADO DAS TERTÚLIAS



 Mais logo quando baterem 21 e meia badaladas na torre sineira da igreja de Santa Cruz, no café ao lado e com o mesmo nome, estará a começar mais uma tertúlia do Lions Clube de Coimbra, e sobre o mote “Vamos falar sobre a Coimbra actual - ciclo de tertúlias de Outono na Baixa de Coimbra”.
Antes de prosseguir e como ressalva, para não parecer que estou contra, saliento que a Baixa muito deve estar agradecida ao Lions por ter feito renascer a velha tertúlia nesta parte velha da cidade há uns meses, mais precisamente no dia 11 de Maio passado. Em bom rigor quem começou com estas tertúlias foi o Gabinete para o Centro Histórico, na pessoa do seu director Sidónio Simões, e sempre sobre o lema “À conversa com o Centro Histórico”. A primeira realizou-se em 23 de Maio de 2011 e as subsequentes até à 5ª e derradeira -julgo que foi mesmo a última-, que se realizou na Casa da Escrita em 18 de Abril, passado.
Depois desta salvaguarda, vou prosseguir. As iniciativas do Gabinete para o Centro Histórico foram muito bem pensadas, mas, já se sabe, o que é bom não dura. Apesar do enormíssimo esforço de Sidónio Simões em mantê-las activas, parece-me, não é possível continuar. Ou seja, uma ideia excelente e que era fantástica para todos, no sentido da transposição de obstáculos invisíveis e resolução de dificuldades, foi deixada cair. E porquê? Porque este homem foi abandonado por todos, mais concretamente pelos mais interessados: os munícipes e o executivo. Os primeiros, os munícipes, de uma forma besta, alheando-se completamente desta iniciativa, nunca deixaram o sofá para comparecer e discutirem os problemas da Baixa e da cidade; os poucos que marcaram presença iam para resolver problemas pessoais, concretos, que deveriam ser apresentados no gabinete de atendimento da Câmara Municipal ou a um qualquer vereador do pelouro correspondente se este estivesse na disposição de receber o visado. Os segundos, os membros do executivo, porque vêm menos que o meu Silvano que usa palas laterais, nem vislumbraram que estavam perante uma emérita ideia de quebrar o gelo de barreira existente entre o poder e o cidadão e, salvo a primeira realizada na junta de Freguesia de Almedina, nunca mais lá puseram os pés. O caricato é que, em alguns casos, estavam anunciados e não se dignaram comparecer. Resultado de tudo isto? Se não estiver enganado, as “Conversas com o Centro Histórico” estão enterradas e sem epitáfio. Repetindo, fica o esforço declarado e visível, para quem quiser ver, de Sidónio Simões para manter viva a chama da discussão em torno de vários assuntos de interesse público.
E foi pena! Sobretudo porque naquelas reuniões havia uma ponte entre o cidadão e o executivo, mesmo sem qualquer elemento decisor, como foi o caso redobrado. Isto é, como estava sempre presente um técnico superior, no caso Sidónio Simões, creio, as matérias versadas eram sempre encaminhadas para os gabinetes de representação política.
O que gostaria de salientar, e foi isto mesmo que me levou a escrever este texto, é que as tertúlias do Lions Clube de Coimbra ou até os “Encontros do Café Santa Cruz”, cuja primeira edição se realizou antes de ontem, pese o grande esforço dos criadores envolvidos, na prática não têm qualquer efeito. E porquê? Porque as discussões por mais valorativas que sejam circulam em regime fechado e não saem do espaço em que são debatidas. Primeiro, tal como se verificou nas tertúlias do Centro Histórico, porque faltam pessoas, cidadãos interessados em discutir a sua cidade; segundo, igualmente, faltam lá pessoas do poder decisório que possam dar continuidade às boas ideias ali tratadas, ou serem influenciadas. Por outras palavras, o que se debate ali naquela ilha não passa para o exterior. Não tem ponte que a releve para o público crítico ou para o executivo. Quem eventualmente o poderia fazer, os jornais da cidade, não faz. Se repararem, sobre o que se passou na quarta-feira nos “Encontros do Café Santa Cruz”, hoje, o Diário de Coimbra destina ao assunto meia dúzia de palavras gerais e uma foto sobre o caso e o Diário as Beiras nem sequer aborda o tema. Ora, perante esta opacidade, quem leva a mensagem aos interessados, cidadãos e governo da cidade? Ninguém, obviamente. Quer dizer, então que o que se disse lá é o mesmo que nada. Quem lá esteve, por parte de convidados, certamente com grande esforço, como é o caso da Orquestra Clássica do Centro, e também a gerência do Café Santa Cruz que, para além de disponibilizar a magnífica sala, gastou dinheiro a publicitar o tema. A pergunta é, perante o laxismo e o desprezo dos interessados, para que servem estas actividades?
É evidente que, penso que estou a ser claro, não pretendo sabotar estas acções. O que pretendo trazer à colação é que se não houver cuidado, tal como aconteceu com o Centro Histórico, mais tarde ou mais cedo, tudo vai dar em “águas de bacalhau”. Já se sabe que quando não houver nada, vai dizer-se na habitual lamuria manhosa de que na cidade não se discutem os assuntos e assim e assado, cozido e frito. Em comentários de revolta vai apregoar-se ao vento que a urbe é uma porcaria. Não é por nada, mas às vezes apetece-me mandar uma série de pessoas para o… outro lado, obviamente, porque sou muito educadinho.

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