segunda-feira, 23 de abril de 2012

O CARTEIRO DO NOSSO LARGO


 “Chegou o carteiro! Das nove para as dez! A vizinha do lado, chegando à janela, logo gritou: “traz carta para mim?”. Para uns são alegrias, para outros tristezas são. O carteiro não tem culpa é a sua profissão”. Era assim que o conjunto típico António Mafra designava o popular correio do nosso imaginário em finais de 1960.
Recentemente chegado à nossa rua, o nosso carteiro é o senhor António Duarte. Está nos Correios há mais de uma vintena de anos, e gosta muito do que faz, diz-me com aquela ênfase que se aplica quando falamos de algo que se entrelaça na alma. Apesar de já não trazer nem uma carta de amor, só contas para pagar, transportando no rosto um sorriso e uma imensa vontade de servir, continua a ser estimado por todos.
Já há uns dias que ando a pensar em escrever um texto sobre os carteiros da nossa rua. Certamente, alguma mente iluminada dos CTT–Correios de Portugal tomado de uma obsessão pela descentralização de serviços, no último ano, deu em substituir semanalmente, os distribuidores de correspondência. Resultado, nos primeiros dias é vê-los numa aflição, perdidos, para encontrar certos números de porta que não estão lá, ou a menina Lurdinhas, que mora no largo, mas a missiva não traz número. Foi por isto mesmo que hoje, ao ver o senhor Duarte à procura de uma morada, me lembrei de escrever este pequeno texto. Quem sabe alguém dos CTT não leia e reflicta que este actual serviço prestado nem serve os utentes nem os carteiros, que se vêem “gregos”, em determinadas situações, para conseguirem levar a bom porto o desempenho da sua missão.
Indo um pouco mais longe, poderemos interrogar: por que acontece esta constante mudança de técnicos semanalmente, se, aparentemente, não aumenta a eficácia nem traz mais-valias às partes interessadas? Será que os serviços dos Correios procuram cada vez mais funcionários-turbo? Ou a medida procura torna-los polivalentes e capazes de reconhecerem um qualquer trajecto? Mas, humanamente, numa semana, isto é possível? Poderemos especular que é para não ganharem certos vícios adquiridos, mas esta rotatividade irá evitá-los?
Não é fazer futurologia, mas adivinha-se que estes digníssimos e respeitáveis profissionais estarão a prazo -será mais uma profissão que desaparece perante este progressismo avassalador. A médio-prazo, com prejuízo de todos, acabarão. Este serviço, pelo menos como o conhecemos tradicionalmente, passará a ser feito por empresas de distribuição, que aliás, na entrega de encomendas já está a ser assim.
Portanto, para a história do nosso tempo, fiquemos com esta fantástica imagem do carteiro, António Duarte, no Largo da Freiria, em Coimbra.


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