quinta-feira, 30 de setembro de 2010

BAIXA: O JULGAMENTO POPULAR SUMÁRIO DO DIA

(IMAGEM DA WEB)








 Hoje, ao bater da meia-dúzia de badaladas na torre sineira da igreja de Santa Cruz, já o Sol se estava a pôr em cima de todos, o “Aspirante” estava com uma piela que nem se tinha, e um bando de caloiros à solta faziam mais barulho que os gaiteiros de Liceia, deu-se início ao Julgamento Sumário do Dia.
Costuma ser às 14 horas, mas o Senhor Doutor Juiz, Meritíssimo Almerindo Abrolhos, convocou todos, incluindo a imprensa escrita e falada –refiro, nomeadamente todos os jornais, a rádio e a televisão, esta a cargo do Luís Perdigão, com a “Tvcoimbra Eusei”- e com voz grave, daquelas vozes de bagaço, únicas de “big father”, exclamou: “por causa do concerto dos U2, devido às modificações no trânsito, e sobretudo às alterações hormonais que tudo isto possa causar nos cidadãos, excepcionalmente, esta semana, o julgamento será realizado às 18 horas –fez um grande sorriso para o Perdigão, que não perdeu a oportunidade para fazer um figurão e um grande plano para a câmara de filmar.
Como das outras vezes, igualmente, este acto jurisprudencial de cidadania activa dos cidadãos nos processos decisórios de grande importância para a cidade será supervisionado pelo pai da Nação, el-rei Dom Afonso Henriques, que aferirá da justeza da sentença.
Perante o povo, e um grupo de caloiros que faziam um escarcéu danado, presente nesta Praça 8 de Maio, o Meritíssimo (sempre com maiúsculas, que o respeitinho é muito lindo) proclamou: “está aberta a audiência!”.

Como é hábito em anteriores pleitos, pelo meirinho deste tribunal, oficial de justiça Senhor Mendes, vai ser lida em voz alta a composição dos altos dignitários residentes e que, em nome do povo –neste caso excepcionalmente em nome de um cidadão, embora em representação da classe- irão fazer justiça.
Vamos tomar atenção, (shiu!), que o “Fura Mundos” fala baixo e, para piorar, ontem andou nos copos até às tantas e não se percebe uma sílaba do que ele diz…(shiu!):

Está a falar ao ouvido do Meritíssimo. Vou aproximar-me, para ver se entendo alguma coisa do que ele diz.
-Meritíssimo, tenho aqui uma nota de protesto do pai da Nação, el-rei Dom Afonso, a insurgir-se contra as comemorações do próximo 5 de Outubro. Escreve ele, que isto é uma bandalheira, que é profundamente discriminatória; que está tudo mal, a começar na Constituição, ao defender a República como único sistema político. E mais, diz o filho da mãe que mal conheceu o pai, que se todos os portugueses pagam um euro para as comemorações, embora seja frontalmente contra, qual a razão de ninguém lhe ter passado cartuxo no peditório?
O Senhor Doutor autoriza que eu leia a nota reivindicativa antes de começar o julgamento?
-Quê? Ó “Fura Mundos”, você ensandeceu de vez? Nem pensar! Isto aqui é um julgamento, não é um comício monárquico! Vamos lá a pôr ordem na casa…como quem diz, na rua.
-Muito bem, excelência. Queira desculpar! Vou então ler em voz alta a composição do tribunal.

Juiz Meritíssimo: Doutor Almerindo Abrolhos (aqui);

Acusação em nome do interesse público (do artista “Zé Pintelho”, em representação de todo o universo artístico da cidade, incluindo o “Zé dos Alicates”): Senhor Procurador Doutor Adelino Paixão (aqui);

Advogado de defesa: Doutor Carlos “popó” (aqui);

Processo 04/2010

Réu: Empresa Municipal de Turismo/ Câmara Municipal de Coimbra

Como já nos vem habituando o Senhor Procurador Doutor Adelino Paixão gosta de teatralizar. Começa por cofiar a barba, passa a mão no avantajando ventre, puxa o colete para baixo, igualzinho às mulheres quando puxam as orelhas a uma saia curtita, ajeita a toga, abre os braços como o Cristo-Rei, e aí está ele pronto a argumentar. Vamos ouvir:
“Senhor Doutor, Meritíssimo Juiz, estamos reunidos nesta praça, melhor dizendo neste fórum popular, porque o cidadão “Zé Pintelho”, um conhecido artista plástico, em representação de todos os colegas, considera ter sido ofendida a sua honra e dignidade ao ser disponibilizada, pela Empresa Municipal de Turismo versus Câmara Municipal de Coimbra, a verba de 200 mil euros, fora as alcavalas, oferecida pelo concerto dos U2 e promovida pela “Ritmos e Blues”.
Meritíssimo, tenha lá santa paciência, mas isto não pode ser! Se estivéssemos no tempo do vereador da cultura Mário Nunes, eu sei lá o que é que já tinha acontecido. Já haveria para aí um abaixo-assinado a correr na Internet, uma manifestação popular, sei lá que mais! Bastava só o nome “Ritmos” para ligarem logo o antigo vereador aos ranchos. Foi preciso um ilustre cidadão, “Zé Pintelho”, levantar o pincel e insurgir-se contra esta pouca-vergonha.
Afirma o senhor Pintelho que, por falta de massa, já há muito que não molha o pincel. Ora, no seu entender –e no meu também, naturalmente, a autarquia não pode dançar ao ritmo de  blues e esquecer as mais elementares necessidades dos artistas da Baixa. Isto é um escândalo Senhor Doutor. Uns são filhos de Deus, outros filhos da puta…ai desculpe, meritíssimo –viu-se que o Doutor Adelino Paixão ficou mesmo meio encabado.
Até porque, sublinho a minha revolta, queira levar em conta que o vocalista da banda é Bono. Ora, Bono…remete-nos para “pro bono”, que em latim significa “para bem do povo”. Por conseguinte, Meritíssimo, se vêm ganhar quatro milhões de euros…ora…é só mesmo fazer as contas. Esta banda é uma fraude!
Perante estes deslizes todos, está de ver que estamos em presença de al…cu…furado. Por outras palavras, há um furo que se detecta no cu…rial.
É meu entender que V. Ex.ª deve condenar a empresa Municipal de Turismo, na pessoa do presidente Alcoforado, assim como todo o executivo e oposição que, em reunião, aprovaram a medida e nem piaram.
Em nome do povo, em nome do senhor “Zé Pintelho”, representante de toda a classe artística da cidade, peço a condenação, “ex aequo”, das duas entidades, por desperdício de fundos, fuga de capitais para a Irlanda e falta de assistência aos artistas mais carenciados da cidade, que nem um cêntimo da edilidade podem contar para molhar o pincel.

Testemunhas de defesa: Luís Alcoforado, fadista de renome, professor universitário, presidente da Empresa Municipal de Turismo (não compareceu porque não teve mesmo hipótese nenhuma de estar presente); Carlos Encarnação, Presidente da Câmara Municipal de Coimbra (não compareceu porque estava muito ocupado a passar os dossiers para o seu vice Barbosa de Melo. Além disso, à mesma hora, a sua netinha, ganhou uma birra do caraças e agarrou-se às calças do avô, de tal forma, que, mesmo com a intervenção de todos os moradores da Rua das Fangas, não foi mesmo possível ausentar-se); Maria José Azevedo, vereadora da Cultura (não compareceu por impossibilidade técnica. Esteve todo o dia a planear vários eventos à mesma hora e no mesmo dia para a Baixa); Luís Providência, vereador do Desporto (não compareceu, alegou que estava a elaborar um rigoroso inquérito às Águas de Coimbra, sobretudo na relação amores infiéis versus Águas de Portugal).

Depois de rebatidos todos os quesitos, entre chatices futuras e tricas passadas, quer da defesa quer da acusação, e após um curto período para ponderação na igreja de Santa Cruz, em que o senhor Doutor Juiz aproveitou para espreitar as pernas da Laurinda, uma devota de todos os santos e que mora na Rua do “Já Chateia ser Virgem”, é convicção profundíssima, imensíssima do Meritíssimo e Reverendíssimo Juiz Almerindo Abrolhos que o Turismo e a autarquia, para além de serem concubinas em ritmos e blues, agiram irresponsavelmente sem levarem em conta os interesses da cidade, na equidade, na justa distribuição por todos os artistas.
O senhor Doutor levou em conta, como atenuante, o facto de Luís Santarino, apesar de ser do partido da oposição ter desvalorizado no “Facebook” este apoio da coligação por Coimbra.
Assim, nas prerrogativas deste estado de justiça de solas rotas, o Meritíssimo condena a empresa mãe e a empresa filha da mãe a aturar os barulhos que os artistas irão desencadear para o futuro. Mais: que cada um dos presidentes, da autarquia e do Turismo de Coimbra, sejam obrigados a arranjar tempo para qualquer artista que solicite ser recebido individualmente.

Está encerrada a sessão –segue-se a tradicional pancada do malho.

1 comentário:

Anónimo disse...

Post tipico de um verdadeiro Tuga! É muito mais fácil criticar, do que parar um pouco e pensar no beneficio futuro que este investimento vai trazer.
O retorno que o concerto dos U2 vai dar à cidade de Coimbra, vale esse dinheiro e muito mais.
Por causa de haver gente com essa mentalidade é que o país está como está.