sexta-feira, 5 de junho de 2009

A BAIXA É UMA FEIRA DE RETALHOS?





 Nos últimos anos, os grandes estabelecimentos que fizeram elevar a Baixa até aos píncaros da história comercial praticamente desapareceram quase todos. Se alguns ainda resistem, muitos dos poucos estão em coma clínico, “mais para lá do que para cá”, como sói dizer-se.
Comecei a escrever este apontamento porque vi o estabelecimento que mostro em cima, através de foto, a ocupar o lugar de um mítico e desaparecido há pouco tempo. Refiro-me ao “Infinito” na Rua da Sofia. Não que este que se encontra no seu lugar –a Feira dos Retalhos- não tenha legitimidade para ocupar um lugar de história. Nada disso. Está lá e ainda bem. Se estivesse fechado seria muito pior. E, neste princípio, reporto-me a todo o tipo de actividades, incluindo os chineses. É preferível estar lá uma qualquer actividade comercial que um estabelecimento encerrado.
Porém, os centros históricos, como tudo na vida, a sua vitalidade assenta na diversidade. E sem entrar em contradição, o que quero dizer é que para além do possível, no estado actual, temos de desejar mais e melhor. A atractividade destas zonas monumentais reside em dois pólos fundamentais: lojas comerciais de qualidade, sobretudo de marcas; a preservação a todo o custo de estabelecimentos antigos e de tradição; alfarrabistas; galerias de arte; lojas de antiguidades, e fundamentalmente uma restauração de ponta, de modo a retirar os jovens dos grandes centros comerciais. Refiro-me, obviamente, a um “Mc Donalds”, a uma “Casa das Sandes”, “Casa das Sopas”, “Só Peso, etc.
Para além disso, é imperioso apostar na animação nocturna na Baixa. É preciso que a autarquia fomente o interesse em quem queira apostar aqui. E, sobretudo, que desbloqueie a ideia preconcebida que se tem de que a tramitação camarária é impossível de transpor. Acho que nesta fase de carência que o centro histórico atravessa deveria ser a autarquia a convidar investidores e não o contrário. Deveria ser criado um gabinete específico para quem pretenda apostar na Baixa. De aconselhamento –no sentido de indicar actividades em falta, em detrimento de outras que há em excesso- e, ao mesmo tempo, ajudar a ultrapassar obstáculos legais. Não digo que se procure contornar a lei. O que digo é que é preciso motivar quem quer investir e não o contrário. Não há nada mais pernicioso para uma economia local ou nacional se, aprioristicamente, se se partir do princípio de que qualquer projecto está envolto em malhas e teias burocráticas que demorarão tempos infinitos a deslindar.
Por outro lado, embora se saiba que a autarquia não pode evitar o encerramento de algumas glórias do comércio e da indústria hoteleira, no entanto, pode influenciar, quer falando com os novos adquirentes, quer com os proprietários dos imóveis. Se assim fosse não teriam fechado grandes casas emblemáticas da Baixa. Que, diga-se a propósito, as autarquias não estão tão impotentes quanto parece. Têm um instrumento legal que podem utilizar: refiro-me à “declaração de imóvel de interesse público municipal”. Que em Coimbra, este meio legal, nunca foi utilizado. Se assim fosse, provavelmente não teria desaparecido a “Brasileira”, o “Arcádia”, a “Central”, o “Basílio” –uma das mais antigas barbearias da Rua Ferreira Borges-, o “Augusto Neves” –uma octogenária casa de ferragens na Rua da Sofia-, o “Loureiro dos Cafés” –uma lindíssima casa de cafés na Rua Adelino Veiga-, e outras que não lembro.
De uma casa que está em coma profundo, como paradigma, lembro o “Turíbio de Matos”, uma casa com um século de existência, que, segundo se consta, os actuais proprietários da loja, em conflito com o proprietário, não atam nem desatam. Segundo as declarações ouvidas de uma sócia desta vetusta firma, o proprietário do imóvel tudo faz para obstaculizar a transmissão do “Turíbio de Matos”. É verdade? Não é? Para aferir, deveria ouvir o proprietário do imóvel e não o ouvi.
Ora, é aqui, nestes impasses que lesam a paisagem urbana comercial, que a autarquia deveria intervir. Até porque, ao fazê-lo, estaria a contribuir para esvaziar o tribunal de mais um litígio iminente. Claro que é mais fácil dizer “isso não é nada comigo, quem quiser que se mexa”. O problema é que só depois de desaparecer o “Turíbio” é que vão correr rios de lágrimas de crocodilo por aquele antiquíssimo estabelecimento. O costume. Só quando nada for possível fazer…

Sem comentários: