segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

ENCERROU O JAIME




  O Jaime esteve estabelecido mais de vinte anos em sapataria. Começou a actividade por conta própria no Centro Comercial D. Dinis, em Coimbra. Ali permaneceu mais de uma década. A seguir, há vários anos, ficou com uma sapataria na Rua Eduardo Coelho número 77. Chamava-se Sapataria Modelo. Irónico, não é? “Modelo”, modelo de quê? Da apatia e deixa correr que se vive hoje no comércio?
Hoje encerrou.
O Jaime tem 57 anos. Ao longo desta maratona comercial perdeu tudo. Ou quase tudo. Desde a casa onde morava, que estava paga, até ao agora estabelecimento encerrado hoje.
Não é a primeira “estória” de comerciantes que acaba assim. Já escrevi aqui no blogue várias. Podem não acreditar mas custa-me escrever mais uma. É como se eu, ao contar, estivesse a entrar na vida privada de alguém que, ainda por cima, está mal, muito mal mesmo. Então, se calhar, interroga você, leitor: se é assim porque escreve? Pois! Realmente, quase não tem explicação. Mas, o que digo em minha defesa, é que escrevo para chamar a atenção. É como se, hipoteticamente e metaforicamente, pusesse os braços no ar a pedir ajuda. Sei que amanhã posso ser eu. Isto não está certo. Já sabemos que a vida é um risco e muito mais uma actividade comercial ou industrial. Mas, bolas!, uma pessoa que sempre trabalhou a vida toda –muitos anos por conta de outrem, numa grande sapataria aqui da Baixa- descontou para a Segurança Social, pagou os seus impostos até não poder mais, não devia acabar assim. Praticamente na miséria. O Jaime não tem direito a subsídio de desemprego e é muito novo para a reforma. Se optar pela pré-reforma, “vou receber meia dúzia de euros que me dá para comprar uma sandes diariamente?" –responde-me, na interrogativa, quando tento animá-lo. Mas é difícil animar alguém que está negro como a noite. Um homem não chora, diz o aforismo popular, mas este homem, se não chorou já durante muitas noites de insónia, amanhã, quando acordar e tomar consciência que não tem trabalho, vai chorar. Tenho a certeza.
“Só quem está nesta situação, sente”, verbera o Jaime, tirando umas palavras a custo lá do fundo da alma.
Alguém tem de fazer alguma coisa pelos “jaimes” deste país. Isto é uma afronta à dignidade da pessoa humana. É uma discriminação. Porque é que os empregados têm direito a subsídio de desemprego e um patrão não tem? Ainda estamos no PREC, quando os patrões eram todos capitalistas? Porca miséria. Merda para isto! Não tenho mais palavras para descrever o que sinto. Fico por aqui…

6 comentários:

luctupuz disse...

É realmente triste. Também revoltante. Observei os últimos dias de portas abertas do "77", tive a oportunidade de observar ontem também o momento em que o espaço ficou "oco". Assim como igualmente observei o olhar do Sr Jaime, indescritível... A noite, coincidia com o momento: estava frio, muito frio. Faltam as palavras para descrever o que se sente a ver situações destas. E saber que outros "77's" estão em vias de fechar por aí, e nós a ver sem nada poder fazer. Não devia ser assim. Dói continuar a ver a baixa neste estado. Àparte deste caso em particular - obviamente não desvalorizando a situação social, ninguém deveria ser obrigado a fechar desta forma as portas! - não querendo ser mal interpretado com estas palavras, digo que deveria ser como o natural rumo das coisas: uns morrem, outros nascem. O principal problema é que na baixa, poucos nascem. Mas vão nascendo, com partos algo difíceis mas vão. Haja esperança!

Anónimo disse...

A maratona comercial do Jaime, não foi bem sucedida. Isto é, não lhe trouxe realização de vida. Não falemos dos lugares do pódio ou de algum "top ten" - sabemos que não foi para isso que ele manteve a "corrida". Embora muitos (um pouco como ele) no lançamento feito à época, se julgassem capazes de num "arranque" fora de série, ultrapassar a concorrência...
Mas o Jaime, preparou mal o percurso. Cometeu erros - alguns irreparáveis. Ainda poderia continuar ? (podemos perguntar). Sim, o ser humano tem essa virtude. Mas ela não é tão linear assim, não se compra ou aplica como um penso rápido. Exige sacrifício, responsabilidade, ponderação, estratégia, humildade, organização, amigos, familia...até a fé. Algumas destas premissas, não foram conseguidas e outras fugiram ás mãos dele.

Leio que perdeu tudo... eu diria que jogou tudo. Atirou tudo para uma fogueira sobre a qual sabia que não iria ter mais lenha para fazer arder. Foi aliás, alimentando essa já "irreal" fonte de calor, com aquilo que não existia, que não era dele - e nem era dos outros de quem ele dependia. E desta forma encerrou esta etapa.

O Jaime terá chorado ! E irá chorar ainda mais, até que o choro e a angústia o libertem para um novo caminho.
Existiam valores no Jaime que acredito estejam intactos. Será por esses que depois desta queda ele se irá levantar de novo.
De certeza que com mais cuidado evitará as ilusões e aproveitará a sua força para eliminar da sua vida os malefícios que o prejudicaram.

E agora ? a legenda da segunda foto vem a propósito ?
Cabe aqui a ignorância metafórica do nome "Modelo" ?
Da directa responsabilidade da apatia e deixa correr ?

“A seguir, há vários anos, ficou com uma sapataria na Rua Eduardo Coelho…”
É preciso saber e ter cuidado naquilo que escrevemos. Principalmente deveria sê-lo nesta frase que retiro do texto (apesar de haver outras).

Não desejo de forma alguma a miséria, e sou combatente da pobreza.
Sou capaz de encontrar modelos de sucesso e de insucesso.
NÃO sou responsável pela apatia e deixa correr... e você ?

O Jaime - ou os "jaimes" como se lê, lamentam a fraca prestação de reforma. O autor do artigo utiliza "estórias" e "metáforas" para abordar algumas verdades.
No entanto, não estamos no PREC não senhor ! Saiba que os "patrões" têm a obrigação de assumir condições essenciais para o serem : idoneidade, responsabilidade, honestidade. Para isso quando constituiem as suas sociedades, subscrevem um capital de risco - e ignoram o capital da consciência e da boa fé.
Em resultado disso não podem exigir ao Estado que lhes garanta por essa razão a sua sobrevivência - os impostos até nem são pagos, as contribuições são pelo minímo - quando são entregues... não há por esta via descriminação.
As verdades e outras descriminações são matéria para outras escritas...mais concretas, justas e oportunas.

Lamento a publicação das inverdades que leio neste artigo no Jornal As Beiras - mais útil seria escrever as realidades e fazer alguma coisa para ser solidário com este Jaime e os outros.
Mas há sempre tempo para corrigir os erros... se houver vontade.
O outro senhor do dia 31 merece outra resposta, a sua intenção é válida...

Luis Manuel ( o Jaime sabe quem é )

Anónimo disse...

A maratona comercial do Jaime, não foi bem sucedida. Isto é, não lhe trouxe realização de vida. Não falemos dos lugares do pódio ou de algum "top ten" - sabemos que não foi para isso que ele manteve a "corrida". Embora muitos (um pouco como ele) no lançamento feito à época, se julgassem capazes de num "arranque" fora de série, ultrapassar a concorrência...
Mas o Jaime, preparou mal o percurso. Cometeu erros - alguns irreparáveis. Ainda poderia continuar ? (podemos perguntar). Sim, o ser humano tem essa virtude. Mas ela não é tão linear assim, não se compra ou aplica como um penso rápido. Exige sacrifício, responsabilidade, ponderação, estratégia, humildade, organização, amigos, familia...até a fé. Algumas destas premissas, não foram conseguidas e outras fugiram ás mãos dele.
Leio que perdeu tudo... eu diria que jogou tudo. Atirou tudo para uma fogueira sobre a qual sabia que não iria ter mais lenha para fazer arder. Foi aliás, alimentando essa já "irreal" fonte de calor, com aquilo que não existia, que não era dele - e nem era dos outros de quem ele dependia. E desta forma encerrou esta etapa.
O Jaime terá chorado ! E irá chorar ainda mais, até que o choro e a angústia o libertem para um novo caminho.
Existiam valores no Jaime que acredito estejam intactos. Será por esses que depois desta queda ele se irá levantar de novo.
De certeza que com mais cuidado evitará as ilusões e aproveitará a sua força para eliminar da sua vida os malefícios que o prejudicaram.

E agora ? a legenda da segunda foto vem a propósito ?
Cabe aqui a ignorância metafórica do nome "Modelo" ?
Da directa responsabilidade da apatia e deixa correr ?

“A seguir, há vários anos, ficou com uma sapataria na Rua Eduardo Coelho…”
É preciso saber e ter cuidado naquilo que escrevemos. Principalmente deveria sê-lo nesta frase que retiro do texto (apesar de haver outras).

Não desejo de forma alguma a miséria, e sou combatente da pobreza.
Sou capaz de encontrar modelos de sucesso e de insucesso.
NÃO sou responsável pela apatia e deixa correr... e você ?

O Jaime - ou os "jaimes" como se lê, lamentam a fraca prestação de reforma. O autor do artigo utiliza "estórias" e "metáforas" para abordar algumas verdades.
No entanto, não estamos no PREC não senhor ! Saiba que os "patrões" têm a obrigação de assumir condições essenciais para o serem : idoneidade, responsabilidade, honestidade. Para isso quando constituiem as suas sociedades, subscrevem um capital de risco - e ignoram o capital da consciência e da boa fé.
Em resultado disso não podem exigir ao Estado que lhes garanta por essa razão a sua sobrevivência - os impostos até nem são pagos, as contribuições são pelo minímo - quando são entregues... não há por esta via descriminação.
As verdades e outras descriminações são matéria para outras escritas...mais concretas, justas e oportunas.


Luis Manuel (o Jaime sabe quem sou)

Anónimo disse...

Pois!

Nâo tenho ido à baixa ...não sabia... inclusivé de alguns pormaiores escritos!

Caramba que situação!

Mas como sempre comentamos, o Jaime cometeu um grande erro ao estabelecer.se nas condições em q se estabeleceu...

Primeiro no D. Dinis e depois na Modelo....

Penso que se ele quiser...provavelmente com a expirencia que possui ... vai arranjar emprego numa sapataria qq aí num shopping!

Não pode cruzar os braços e deixar-se vencer pelo orgulho!

Vamos torcer para que tudo corra bem!

abraço

(de mais um ... via Luis Manuel)

Anónimo disse...

Voltando, porque ficou algo por dizer.

Do meu pensamento vão duas questões essenciais para o Jaime :

1- Não ao desespero
2- Coragem

Sobre o que é importante para o Jaime :

1 - Filhos (sei o grande amor que ele teve - e terá obviamente ainda, enquanto os vi pequenos) têm obrigação - repito obrigação, de olhar pelo pai;
2 - Família
3 - Amigos

Luis Manuel

Anónimo disse...

respondendo ao outro Luis :

Nascem de partos dificeis, por vezes prematuros ou infelizmente com algumas imperfeições "genéticas".

Não devia ser assim... mas, tem sido. E actualmente as condições não são nada favoráveis.
Boa a sua sensibilidade, e espero que outros assim a tenham.
Neste caso em particular - não se engane a avaliar a "forma"...

De qualquer maneira, merece o meu abraço. E estenda a solidariedade. Outros vão ( e estão ) a precisar.

Luis Manuel