terça-feira, 18 de dezembro de 2007

COMERCIANTES-PROLETÁRIOS UNÍ-VOS!

(IMAGEM DA WEB)


  Foi promovido pela Associação Comercial e Industrial de Coimbra, no dia 11 deste mês de Dezembro, um debate sobre a crise do comércio, na sua sede, com a presença do presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), José António Silva. Depois de uma longa e esclarecida explanação, acerca da situação do país, abarcando os sectores, primário, secundário e terciário, a sua brilhante intervenção incidiu então sobre o comércio e serviços, deixando todos os presentes, pela sinceridade imanada do seu discurso, senão petrificados, pelos menos apreensivos e angustiados quanto ao futuro que os espera. Foi um esclarecimento arrasador, em termos de prospectivas, onde, pela descrição de conversas tidas com o primeiro-ministro e secretário de Estado do Comércio, José António Silva mostrou a nu, em retórica, o autismo do chefe do governo e a lei da selva desejada pelo segundo. Só faltou o apelo para que os pequenos comerciantes mudem de actividade –mas para qual?- e emigrem deste país miserabilista.
Depois da intervenção do presidente da CCP, onde apelava à união de todos, os cerca de oitenta comerciantes que estiveram presentes na ACIC, certamente aperceberam-se, por um lado, do clima de desespero e impossibilidade de mudar o que quer que seja que invadiu a sala daquela associação comercial. Foi como uma nuvem negra de pessimismo que se colasse aos presentes. Poucos não terão sentido um arrepio depois do esclarecido discurso proferido pelo orador. Mais claro, conciso e contundente, as palavras de José António Silva, não poderiam ter sido. Por outro lado, no debate que se seguiu, foi palpável o desânimo instalado. Especulativamente e retroactivamente, poderíamos pensar que estávamos 1786, em França, em pré-ruína financeira, em que o Tratado de Comércio entre este país e Inglaterra, abrindo as portas aos produtos ingleses, levou à falência milhares de pequenos industriais e artesãos e em que a pequena burguesia comercial alimentava, através de impostos asfixiantes, dilacerantes e exacerbados, os luxos da classe dominante, a Nobreza, e esteve na génese da Revolução Francesa e do Iluminismo que se lhe seguiu. Seguindo o mesmo raciocínio, também aqui não faltou a recorrência ao absolutismo do nosso governo, onde o primeiro-ministro, analogicamente, seria Luís XVI, onde, comparativamente à França daquela altura, governava com poderes absolutos, controlando a economia, a justiça, a política, e até mesmo a religião. Na similitude histórica, personificando o "terceiro estado", também não faltou a estratificação e a hierarquia da sociedade: no topo da pirâmide social meia dúzia de grandes grupos económicos, os políticos e os gestores públicos. Na base da pirâmide social, os descamisados, em crescente miséria extrema, os camponeses, os trabalhadores assalariados e a burguesia, simbolizada pelos comerciantes e a classe média em desaparecimento acelerado. Sem esquecer, obviamente, os desempregados a aumentarem desmesuradamente.
Ideologicamente, naquela sala da ACIC, sentiu-se a confusão nos valores e princípios instalada entre os presentes. Como se a formação de ideias até aí defendidas, as bases de uma sociedade burguesa e capitalista, entrassem em colapso, no oposto, no caos da ideologia. Como se houvesse uma transmutação do materialismo racionalista setecentista, deixou de se saber quem eram os Girondinos e os Jacobinos. Ou para outra semelhança dividida partidariamente, entre a esquerda e a direita; foi como se os lojistas, que personificam o factor capital, criadores do empreendedorismo e do emprego, de repente, virassem trabalhadores sindicalizados. Ouviram-se alguns comerciantes, confessando-se de “direita” reivindicarem medidas drásticas contra o “Grande Capital”, desde o apelo à greve, o não pagamento à Segurança Social, e até uma longa marcha até Lisboa. E ainda mais: o encerramento de todo o comércio ao domingo.
Alguém, de entre a assistência, com alguma clarividência, a finalizar o debate lembrou que a “guerra” injustamente desigual nas armas empregues pelos dois contendores, travada entre a pequena loja de bairro e a grande superfície, jamais será ganha sem o apoio dos consumidores. Ora, o encerramento ao domingo, para estes, indo contra os seus interesses, será um atropelo aos seus direitos e o efeito será contraproducente, completamente, o oposto do desejado. Insistir nesta tecla é o mesmo que continuar a aceitar que os consumidores considerem o comércio tradicional como anacrónico, pacóvio e atrasado. Uma espécie de comparação entre o comboio a vapor e o TGV, lembrou o tal comerciante. Até porque o encerramento de todo o comércio ao domingo apenas irá transferir as suas compras para o sábado. Não vai resolver absolutamente nada, enquanto se mantiver esta “moda”, que, infelizmente irá durar muitos anos. O que é preciso é evitar, a todo o custo, novos licenciamentos e aberturas de mais megacomércio, quando a quota de oferta é largamente excedentária, comparativamente aos restantes países europeus, rematou o tal comerciante. Ia caindo o Carmo e a Trindade. Nestas assembleias, onde raramente o pensamento diferenciado da maioria tem lugar, e tudo o que vá contra o unanimismo dos presentes é a favor do situacionismo. Então, nada como uma grande vaia, na linha do radicalismo Jacobino: “Morte ao Rei e a quem o apoiar”.

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